Fabio Santiago é um dançarino. Os ventos de Dionisio, o deus da embriaguez, sopram em seus versos. Rumores antigos guiam a escrita do poeta. Estamos em um baile do século 19, época em que a contradança reinava. Mistura de todas as danças, ela empresta aos versos de Fabio uma contínua inquietação.
Também Augusto, poeta de agosto, carrega um nome antigo. Ele remete à Antiga Roma, quando o deus Dionísio se transformou em Baco. Sempre a embriaguez, sempre a ondulação, todo o tempo a mistura. Não há trégua. “A nau em redemoinho/ girando sem conseguir parar”, o poeta descreve.
Percebo uma mística secreta na poesia de Fabio Santiago. O ritmo giratório dos versos evoca a dança sagrada dos Dervixes, os monges ascéticos do passado. Ao leitor, não cabe ler, mas voar. Mais do que compreender, ele deve se deixar queimar pelas palavras. A poesia como ardência, como fogo, como incêndio. Fabio é um poeta incendiário.
“Tenho uma melancolia que nunca desaponta”, ele escreve. E aqui está o paradoxo: por sob a dança contínua e festiva, há uma imensa tristeza. Há uma armadilha. O leitor se vê preso no embaraço das palavras. “Tinha o poder de criar drogas poderosas”. A poesia se torna narcótico e também anestesia. Um vício que, em vez de decair, eleva. Aqui me ocorrem os versos mágicos de Rumi: “Não importa de que altura olhes, / ele estará ainda mais alto”.
Leitores estáticos terão dificuldades em ler os poemas de Fabio Santiago, que exigem uma atitude de deambulação e de dispersão. Ele mesmo define seus poemas como “redemoinhos de palavras dançantes”. Dedica seus versos ao caos. Prende-se ao fluxo, desarticulado, e não ao resultado.
Fabio escreve como um ritmista. É o balanço das palavras e não seus duros significados, é o entrechoque entre elas que o guia. É como estar em um baile: ou você se levanta e dança, se entregando à vibração da música, ou você se cala. No caso: fecha o livro.
Lembro que agosto – o mês de Augusto – é também o mês dos meteoros. Grandes chuvas de fragmentos cruzam os céus dos poemas. Desde logo, o leitor deve desistir de capturá-los. Resta-lhe parar e observar. Resta o silêncio. Exige-se dele, ainda, “o éter do esquecimento”. Para contemplar o firmamento, é preciso esquecer.
No fim, quando as palavras se aquietam, forma-se uma infecção. Diz o poeta: “Infeccionado/ o texto jazia no ponto final”. A infecção é uma invasão. Alguma coisa pesada invade os poemas e os paralisa. A poesia precisa da leveza para existir. Leveza que beira o desastre. Escreve Fabio: “A embarcação sacoleja/ onda engolem o convés/enxergo pouco”. A nitidez, para Fabio, é a morte da poesia.