
Estávamos tão felizes!
Quanto Vale? Pergunto sem pestanejar, me diz quanto vale?
Olho pelo retrovisor do veículo e avisto um caminhão em disparada, assustado falo para a minha esposa que está ao meu lado – Não vai parar, não vai frear, não vai parar!
Ela abaixa o quebra sol, abre o espelho.
A carreta arrebenta o carro que está a sua frente, fazendo com que este, venha a colidir na traseira do nosso automóvel.
Ambos sinalizávamos com o pisca alerta. A imensa fila demonstrava o que depois descobrimos, haviam dois acidentes na BR. Com o nosso, o número subiu para três.
Pergunto para a companheira se ela está bem, em seguida saio do carro para ver a situação.
Um homem de boné confere o estrago na lataria do caminhão, a família do outro carro consola o menino de uns nove anos e a filha de doze ou treze.
Pessoas de outros veículos descem para ver este cenário de escombros, caminhoneiros também circulam por ali, parecem preocupados.
Começo a filmar e fotografar os carros e o caminhão. O motorista do outro automóvel atingido, faz o mesmo, o dele deu perda total.
Veículos que trafegam na mão contrária, filmam o acidente.
Quanto vale? Me diz, grita daí. Quanto vale?
Quem é o motorista do caminhão? Pergunto. Uma pessoa que nem lembro o rosto, mostra o moço
– É o rapaz sentado no asfalto.
Vou em sua direção – Você está bem? Se machucou? Sua empresa tem seguro?
Ele me passa o número do patrão. O dono da transportadora nos envia o documento do caminhão e a carteira do motorista, pelo whats.
Estávamos tão felizes, a vida é frágil demais. Somos suscetíveis ao acaso.
Talvez a morte seja o vazio que sentimos ao ouvir a pancada do caminhão no outro veículo, que impulsionado bateu e arrastou o nosso. Talvez a morte seja este vazio, o da incapacidade.
Quanto vale? Vá, me diga. Quanto vale?
Depois de horas parados ali, a vida se impôs, neste dia, vencemos a irremediável.
A transportadora não irá pagar a franquia do meu seguro, é o que diz o dono da empresa, no dia seguinte. Mesmo culpado, nega as responsabilidades.
A carreta em alta velocidade atinge dois carros, seis pessoas poderiam ter suas vidas ceifadas, mas a empresa não se importa com gente, apenas com a sua frota e os seus gastos.
Quanto vale? Diga, pode ser baixinho. Quanto vale?
Ao chegar em casa uma música toca em minha mente e Otto canta, “Distraída pra morte/Eu estava sim…”
Abracei a minha esposa e celebramos a vida. Não apenas a nossa, também daquela família.
O veloz motorista estava vivo. O seu trabalho é levar cargas, andar rápido, cumprir metas, gerar lucros.
Quanto vale a vida? Vamos, me responda logo! Quanto vale a vida?
Posso ouvir meu querido amigo, o guardador de memórias, na noite passada ao acidente, em um bar, me dizendo sorrindo – Vale quanto? Vale quanto? Vale quantos Whiskys?
Estávamos tão felizes.
Nesta hora sorrio para ela, estamos vivos e bem, apesar de tudo.
Quanto vale? Diga aí?
