Fabio Santiago: Não, não, não!

Febril, talvez esta seja a palavra que defina tudo.

A biblioteca está movimentada hoje. Um rapaz, parece ter pressa, vestido com jaqueta cinza, carrega consigo um semblante sombrio.

“Esse parece um lorde aí sentado…”

É o que consigo ouvir, estranho, nada fiz para o moço.

Não, não, não, lorde, não! Estou mais para fidalgo, cavaleiro da triste figura, moinhos, gigantes, Rocinante, se é que me entende, Dom.

Penso, não digo nada.

Faz frio, que a vida siga devagar.

Percebo a sua presença durante todos os dias da semana, caminha cada vez mais rápido, indo de sala em sala. Não olho em sua direção, mantenho distância.

Justo na sexta-feira, o homem sombrio está raivoso, baba. Seu rosto parece dividido, parte da face enfurecida e a outra sem a presença de luz. 

Estava trabalhando, o eco da palavra, “lorde”, fez com que o avistasse, há uns metros de mim.

A moça me avisa que ouviu o sujeito de jaqueta cinza ameaçar. “Se pudesse ele agrediria você!”

Os seguranças chegam!

Não, não, não, sou fidalgo, fantasmas, exércitos, ovelhas, se é que me entende, Dom.

Sou de la Mancha. Espere aí, este cavaleiro furioso só pode ter vindo de lá.

Penso, não digo nada.

Devo tomar mais cuidado, antes que ele consiga me fazer mal.

Neste frio da porra, sou um iceberg à deriva.

Páginas sobrevoam, um ciclone de papéis escritos gira sem parar.

Em febre, espero que este dia acabe logo.

Lembrei ter visto o sujeito sombrio esbravejar, com fogo nas ventas, ao discutir com uma estátua.

Pensei em recitar para ele Lord Byron, já que insiste em chamar um fidalgo de triste figura de lorde.

Não, não, não! Melhor não.

Preciso retornar para a minha Dulcineia de Toboso, antes que o feitiço acabe comigo.

Piso no breque, desço, estou fora, chega do Two-face, duas caras tenebroso, sombrio babão.

Vai-te embora, sou o fidalgo, Dom. Se é que me entende.

Continuo febril, apago a luz, esquento a noite.

“Quando a própria vida parece lunática, quem sabe onde está a loucura? Talvez ser muito prático seja uma loucura. Renunciar aos sonhos – isso pode ser loucura.”

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