Fabio Santiago: Craseado

Caminho rapidamente pelo calçadão, é fim de tarde, sigo em direção ao estacionamento, no meio do caminho havia uma crase, havia uma crase e uma conversa afiada no meio do caminho.

Três amigos, vestidos com uniformes do ensino médio, caminham em minha direção. Horário de saída da escola, percebo outros jovens com o mesmo traje.

Consigo ouvir o tom agudo de longe, terei que passar por eles, não consigo desviar,  o mais ruidoso fala mal da professora.

Repito aqui o que ouvi, “Crase vá tomar no…”, “aquela…querendo que eu aprenda crase, isso não serve para nada!”

Logo à mestra, representante daquela classe que é tão desrespeitada pelos governos, prefeituras, ministérios, secretarias, pais e alunos. Neste país onde destroem a profissão, retirando direitos e mantendo salários defasados, toma-lhe crase, rapazinho.

Ele continua a babar raiva pelo canto da boca, seus amigos parecem concordar.

Caminho com cara de poucos amigos, me importo apenas com a professora e a crase.

Os não craseados se apagam junto à tarde.

Um dia aprenderão, será?

As luzes do carro iluminam a cidade, o trânsito intenso faz com que o velocímetro não passe de trinta por hora.

Ao entrar na via rápida, o grande número de carros faz com que o fluxo fique cada vez mais lento, chego a parar o veículo.

Há uma placa próxima ao sinaleiro, nela está escrito “acesso a (nome da rua)”.

Cadê a crase? Se eles ignoram o português, quem dirá os meninos?

Em casa comento sobre a fala dos alunos que deparei no calçadão. O desrespeito com a professora me causou espanto, para não dizer algo mais duro.

Enquanto durmo, sonho que estou de boné, nele percebo uma crase apontando para minha cabeça que tem forma de A. Garotas de uniforme escolar riem de mim, da crase apontando para a forma de vogal que carrego no rosto, dizem aos berros que não sirvo para nada!

Problemas à vista.

Vou ficar à toa.

Craseado.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *