
Depois do impactante “Amanhã vai ser pior”, Marcelo Conde nos apresenta este “Ao perdedor, os pombos”, uma sofisticada narrativa protagonizada pelo publicitário carioca Eduardo em que, de maneira corajosa – como a boa literatura precisa ser –, são satirizadas, além de outros ruídos e brutalidades contemporâneas, a masculinidade urbana, sua violenta prevalência, e a hipnose operada pelo desejo de fazer parte da grande luz neoliberal ainda tão dependente dos truques da linguagem publicitária.
Em um conjunto de cenas e momentos narrativos muito bem construídos, há, pelo menos, duas passagens em que, afirmo com toda convicção, o autor leva sua escrita ao patamar máximo que um texto literário pode chegar. São passagens de exposição e profundo escrutínio do absurdo da existência humana em um grau que poucas vezes se encontra na literatura brasileira contemporânea.
Não é literatura engajada, não é literatura para leitoras e leitores que buscam conforto em histórias que apenas confirmam suas sensibilidades, suas certezas e buscas por esperança. Literatura madura não promete esperança, apenas – e isso está longe de ser pouco – entrega a verdade que só aquela autora ou aquele autor, com a força da sua voz singular, pode entregar. E Marcelo e sua literatura, com seu sarcasmo, suas minúcias e seu humor, têm muito a nos entregar.
Indo direto ao ponto: temos aqui um romance que, elegendo um protagonista tóxico absorvido pelos incontornáveis endividamentos do corpo e da alma que sustentam nossas patéticas vaidades e ilusões – sem deixar de propor nas entrelinhas uma profunda reflexão ética sobre a velocidade que funciona para encobrir desespero neste mundo que está sempre por colapsar –, prende, diverte, envolve, abala. Um livro que, depois de iniciado, é impossível de se largar.
A Aboio acerta ao editar este autor que já é uma das vozes mais importantes da atual geração.
Paulo Scott
SOBRE O AUTOR
Marcelo Conde nasceu no Rio de Janeiro. Viveu por Tereza anos em São Paulo, até se mudar, em 2019, para Barcelona. Hoje, mora em Madrid. É autor do romance “Amanhã vai ser pior” (Patuá).